sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Vladimir Herzog - Casos que abalaram o país

Não ninguém que  tenha estudado sobre a ditadura militar e não tenha ouvido falar de Vladimir Herzog. O jornalista "suicidado" pela ditadura. A imagem do jornalista morto é uma das mais famosas no país atualmente.



Nascido em Osijek, na antiga Iugoslávia em 1937. Filho de Judeus que fugiram da guerra, não conseguia imaginar que seria perseguido por outra forma de ditadura no país que seus pais pensaram encontrar a paz.
Vlado Herzog achava seu nome muito exótico, e passou a assinar como Vladimir.
Se formou em Filosofia pela USP e trabalhou como repórter no jornal Estado de São Paulo até 1965.
No início da década de 60, casou-se com Clarice. Com o golpe militar de 1964, o casal resolveu passar uma temporada em Inglaterra e Vladimir conseguiu trabalho na BBC de Londres. Lá, tiveram dois filhos, Ivo e André. Em 1968, a família voltou ao Brasil. Vlado trabalhou um ano em publicidade, depois na editoria de cultura da revista Visão. Em 1975, foi escolhido pelo Secretário de Cultura de SP, José Mindlin, para dirigir o jornalismo da TV Cultura.
Nessa época atuava politicamente, se filiou ao Partido Comunista Brasileiro. No dia 24 de outubro de 1975 o jornalista se apresenta voluntariamente para dar um depoimento na sede do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações/ Centro de Operações de Defesa Interna), em São Paulo, para prestar esclarecimentos sobre suas ligações com o PCB (Partido Comunista Brasileiro). No dia seguinte estaria morto, Herzog tinha 38 anos.

Depois que entrou no DOI, Herzog trocou de roupa e vestiu o macacão dos presos.
 Ainda pela manhã, foi acareado com dois presos. Com as cabeças cobertas por capuzes de feltro preto, eles não podiam se ver. Mas um deles, Konder, reconheceu o amigo: “Empurrei a borda do pano e vi o preso que chegava. Eu o reconheci pelos sapatos: eram os mocassins pretos que Vlado usava.”
Nessa hora, Vlado negou que pertencesse ao PCB e Konder e o outro preso foram retirados para um corredor, de onde ouviram os gritos de Vlado e a ordem para que fosse trazida a máquina de choques elétricos. “Os gritos duraram até o fim da manhã. Os choques eram tão violentos que faziam Vlado urrar de dor”, diz Konder. Um rádio foi ligado em alto volume para abafar os sons. Meia hora depois, por volta das 11h, Vlado foi para a sala de interrogatórios.
“Mais ou menos uma hora depois, me levaram a outra sala onde pude retirar o capuz e ver o Vlado. O interrogador, um homem de uns 35 anos, magro, musculoso, com uma tatuagem de âncora no braço, mandou que eu dissesse a ele que não adiantava resistir”, lembra Konder. Vlado estava com o capuz enfiado na cabeça, trêmulo, abatido, nervoso. Sua voz estava por um fio. “Fui obrigado a ajudá-lo a redigir uma confissão que dizia que ele tinha sido aliciado por mim para entrar no PCB e listava outras pessoas que integrariam o partido.” Konder foi levado e os gritos recomeçaram. Essa foi a última vez que Vlado foi visto e ouvido. “No meio da tarde, fez-se silêncio na carceragem”, diz George Duque Estrada que também estava preso no DOI.
Suposta foto de Herzog: Nu e humilhado na carceragem do DOI.

No dia 25 de outubro de 1975 divulgam o suicídio de Herzog. Segundo a versão oficial, Herzog teria se enforcado com o cinto do macacão de presidiário que vestia desde sua entrada no DOI/CODI. Os macacões do DOI não tinham cinto. Suicídios desse tipo são possíveis, porém raros. No porão da ditadura, tornaram-se comuns, maioria até. Dos 17 casos anteriores de suicídio por enforcamento, oito não tiveram vão livre. Em dois, os presos teriam morrido sentados.
Mas o DOI tinha sua própria estratégia para lidar com o assunto. O corpo de Herzog foi entregue à Polícia Técnica e levado ao Instituto Médico Legal, onde chegou sem a roupa com que fora fotografado, mas com os próprios trajes. O laudo do exame de corpo de delito, assinado pelos médicos Harry Shibata e Arildo de Toledo Viana, do IML, concluiu: “quadro médico legal clássico de asfixia mecânica por enforcamento”. Ainda na noite de sábado, o corpo foi enviado ao Hospital Albert Einstein. Estava tudo pronto para mais um sepultamento típico de mortes ocorridas nas dependências das Forças Armadas, durante a ditadura: rápidos e discretos.
Clarice não quis assim. Para que houvesse velório, ela marcou o enterro para a segunda. No domingo, cerca de 600 pessoas foram à cerimônia, entre eles o cardeal Arns e o senador Franco Montoro. “Era a primeira vez que um arcebispo e um senador da República velavam um morto do regime”.
Vladimir era judeu e no judaísmo os suicidas são sepultados com desonra, já que é considerado crime.
O rabino ao preparar o corpo notou sinais de tortura e se negou a enterrar o josrnalista como suicida.

Foto do jornalista morto: Uma das imagens símbolo
da resistência a ditadura.

No cemitério israelita do Butantã, os responsáveis pelo funeral apressaram tanto a cerimônia que dona Zora, mãe de Vlado, não chegou a tempo de se despedir do filho, viu apenas quando jogavam terra por cima do caixão. Quatro jornalistas que estavam presos no DOI-CODI foram levados até o local. Konder foi um deles: “Não deixaram a gente se trocar, me levaram com roupas sujas de urina, sangue e fezes. Foi assim que assisti ao enterro de meu amigo.”
Os presentes citavam navio negreiro de Castro Alves pois realmente era uma época de "horror perante aos céus".
Nas ruas o clima era outro. Ainda na segunda-feira, cerca de 30 mil estudantes da USP, PUC e Fundação Getúlio Vargas entraram em greve. A garotada queria marchar pela cidade, mas aguardava a reunião com os jornalistas. Juntos, aprovaram a realização de um ato religioso pela memória de Vlado na sexta, dia 31. O cardeal Arns tomou a iniciativa: ofereceu a catedral da Sé e disse que estaria lá.
Por medo da manifestação que iria ocorrer o arcebispo foi procurado pela ditadura lhe pediram para cancelar o evento. “Fui informado que existiriam mais de 500 policiais na praça com ordem de atirar ao primeiro grito. Se houvesse protestos, eles metralhariam a população”, lembra dom Paulo. A estratégia dos manifestantes era chegar à praça em pequenos grupos, evitando aglomerações. Cerca de 8 mil pessoas se espalharam pelas escadarias da Sé. As que conseguiram entrar viram o cardeal, o rabino Henry Sobel e mais 20 sacerdotes, entre eles dom Helder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife. “Ninguém toca impunemente no homem, que nasceu do coração de Deus para ser fonte de amor”, disse dom Paulo. “Nas minhas dores, ó Senhor, fica ao meu lado”, respondeu a audiência.

Após mais de 30 anos a morte do jornalista de tornou um marco de resistência a ditadura, sua morte causou grande revolta popular, sua esposa Clarice ("Choram Marias e Clarices" esse trecho de O bêbado e a equilibrista é dedicado a ela). Conseguiu que a União fosse responsabilizada pela morte do marido.
 Herzog e outros tantos se sacrificaram por um sonho de um país melhor, e sua morte não pode ser simplesmente esquecida.
Foram anos terríveis que as gerações futuras devem se permanecer conscientes para fazer desse país um lugar igualitário.

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