quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Crimes Misteriosos: Crime do Parque

" Belo Horizonte era cenário de muitos crimes misteriosos, o mais famoso deles, o crime do parque, continua sem solução até hoje" (Roberto Drummond  - O cheiro de Deus)

Antes de ler esse livro, confesso a vocês que nunca havia ouvido falar desse crime, perguntei a minha avó e ela disse que foi bem famoso na época, andei pesquisando sobre o assunto e eis um crime que abalou minha bela cidade na década de 40.
O Parque Municipal, localizado na Av. Afonso Pena é considerado um ambiente familiar e ponto de lazer na cidade.

















Nessas fotos podemos ver como o parque atualmente é lindo e bem cuidado.
Quando criança eu amava esses barquinhos.
Mas o parque nem sempre teve essa aparência bem cuidada.
 Atualmente ele tem uma grade que o circunda, guardas espalhados, mas nos anos 40 não tinha nada disso e era evitado pelas famílias. Não possuia iluminação, era o ponto perfeito para estupros, ladrões, homossexuais e prostitutas, era chamado pela imprensa de "valhacouto de mal feitores" (Adoro o linguajar de antigamente) .
No dia 05 de dezembro de 1496, algumas alunas do Instituto de Educação, próximo ao parque cortam caminho passando por ele e se deparam, num local mais ermo com um cadáver de um homem, que jazia sujo e ensanguentado. Era Delgado, um rapaz de uma família influente em Campinas.
Começa uma investigação sobre a vida de Delgado e descobre um segredo bem guardado, apesar de sua aparência máscula ele levava uma vida homossexual ativa e frequentava o parque frequentemente. Apesar da enorme repercussão do crime, a polícia nos primeiros dias, nada consegue, trabalhando com hipótes de crime passional, latrocínio, etc. E ainda ocorrem várias falhas técnicas como a não inspeção do local do crime pela polícia técnica e misteriosamente, as roupas ensanguentadas de Delgado desaparecem misteriosamente no necrotério. Provocando um imenso impacto junto a populaçãi, que exigia a solução do crime, boatos corriam soltos a longo do culpado, um dos mais impactantes era que o crime era passional e envolvia um integrante da alta sociedade mineira e a polícia estava o protengendo, por isso o sumiço das roupas. 
Surge então o primeiro suspeito, Nicanor Pereira da Silva, filho da empregada de Delgado, mesmo com o brutal interrogatório ele nega a autoria e não sabe porque se tornou suspeito. Os "carinhos" da polícia fizeram tanto efeito que ele suicida, cada um interpreta o ato a sua maneira, mas sem provas, a polícia volta a estaca zero. Surgem outros boatos, como a vingança de um marido traído, e que o crime não teria acontecido no parque e sim numa mansão no bairro Serra, ou que era uma vingança da família de uma ex noiva da vítima.
Em 1948 o crime era considerado insolúvel, eis que surge um novo suspeito, uma bailarina da noite, Iolanda Monteiro, acusa seu companheiro, Paulo Gomes de Matos, também bailarino, como o real assassino de Delgado, sendo dificuldades financeiras o móvel do crime. Começa então um busca frenética do acusado, logo se sabendo que este se encontrava em Buenos Aires. A polícia então providencia junto ao Itamarati e ao Ministério da Justiça um pedido de extradição contra o acusado, inutilmente, porque ele sumira do mapa, não sendo encontrado em lugar algum. Até que, em 1951, ele é preso em São Paulo. Também submetido a violentos interrogatórios, ele nega veementemente a autoria do crime, ao mesmo tempo em que acusa a esposa de querer perdê-lo por despeito e raiva. Sua versão é tão convincente que a polícia não tem outra alternativa a não ser soltá-lo. Mais uma vez, nada.
O crime passa a ser considerado insolúvel, até 1953...
Nesse ano, mais precisamente no mês de março, uma bomba explode junto à opinião pública mineira e nacional: Yeda Lúcia Ribas, ex-funcionária da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, e filha de conhecido empreiteiro de obras públicas, que estava em processo de ação de anulação de seu casamento, alegando erro essencial sobre sua escolha, após tentativa fracassada de desquite amigável, acusa o próprio marido, o jovem diplomata e funcionário da embaixada brasileira em La Paz, Bolívia, Décio Escobar, de ser o verdadeiro autor do brutal assassinato ocorrido no Parque Municipal. Segundo ela, ficara sabendo de tudo em uma determinada noite em um hotel em Porto Alegre (outra vez, Luiz Morando dá outra versão; segundo ele, a revelação se deu em La Paz). Acidentado estranhamente com um disparo de arma de fogo, que lhe ferira a mão direita, e em clima de total horror e histeria, Escobar começara a gritar alucinadamente "É ele! É ele que não me larga... Luiz Delgado...". Depois, começara a lhe contar como tudo aconteceu.


O delegao pede a prisão preventiva de Escobar, mas o próprio acusado ao saber das denúncias vai até Belo Horizonte e é preso no aeroporto.

Nesse meio tempo, a polícia consegue novas provas contra o suposto assassino: primeiramente, um fotógrafo, Duílio Severino, acusado por Zuquim de ser o real assassino, incrimina Escobar, informando à polícia que o acusado lhe teria confessado o assassinato, tendo mesmo queimado em seu atelier suas roupas manchadas de sangue. Depois, um fazendeiro gaúcho, Dirceu Andreotti, e Flávio Stockler, estudante em Ouro Preto, também fazem o mesmo: Escobar também lhes teria confessado o assassinato.
O que mais chama a atenção em Décio Escobar é sua aparência física: bastante alto e magro, calvo, usa uma barba estilo nazareno, vestindo-se sempre de maneira impecável. Fumando demais, seus olhos nervosos denunciam uma pessoa um tanto quanto acuada, apesar de muitos acharem que suas poses eram estudadas, fazendo parte de sua defesa. Frente ao juiz, mantém-se absolutamente calado, mesmo sendo alertado de que seu silêncio era pior para ele. E nem quando lhe foi mostrada uma fotografia de Delgado, sua fisionomia se alterou, continuando em silêncio. Aos repórteres, entretanto, jurava inocência, acusando a esposa de querer sua caveira para conseguir o anulamento de seu conturbado matrimônio.
A imprensa não perde tempo e escancara o escândalo. Não passa um dia sem que novas e sensacionais testemunhas e novas provas fossem estampadas nos jornais, revalando um universo desconhecido da rica e tradicional
família mineira, onde não faltavam homossexualismo, sadismo e violência física, rumores de envolvimento de pessoas importantes ocultamento de provas e assim por diante. E todos ficavam sem saber em quem acreditar, principalmente depois que a empregada doméstica de Escobar, Maria do Nascimento, depõe e incrimina o poeta, dizendo-se ser a pessoa a quem ele entregara suas roupas manchadas de sangue, em completa contradição ao que Duílio Severino informara à polícia. Além do mais, tudo é motivo de desconfianças contra Décio: até um livro de poesias – Rua Sul – editado por ele em Porto Alegre em 1950, suscitou enorme controvérsia, muitos vendo nas entrelinhas de alguns poemas a confissão do assassinato. Terminou sendo anexado ao processo como elemento de prova.
Depois de um ano na prisão, aos 23 de abril de 1954, Décio Escobar é levado a julgamento popular no Fórum Lafaiette, tomado por uma multidão ansiosa e frenética de mais de mil pessoas, ficando o triplo do lado de fora sem poder entrar. O julgamento se transformara num circo. (Coisa normal no Brasil).
Após a leitura dos autos e seu primeiro pronunciamento à justiça, negando veementemente ser o assassino, ao mesmo tempo em que acusa a esposa de perjúrio para conseguir a anulação do casamento, e aproveita para esclarecer as supostas confissões, tudo não passara de brincadeira, dessas que as pessoas fazem com os amigos em mesas de botequim, nunca esperando ser levado a sério.
Yeda Lúcia, a esposa, é a primeira testemunha a depor. Muito elegante em um tailheur cinza, com olhos absolutamente duros e frios, com uma calma que enervava a platéia, confirmou todos os seus depoimentos anteriores: que o marido era homossexual, freqüentador de um cabaré de péssimo ambiente em La Paz de nome "Gato que Fuma" freqüentado por invertidos e pela fina flor da marginália local. Que ele bebia e dançava com viciados, às vezes ficando dias sem voltar para casa, dormindo ao lado desses "índios". Finalmente, que ele, em um momento de desespero confessara a ela ser mesmo ele o autor do crime.
E assim, uma a uma, as testemunhas vão sendo ouvidas: Stockler confirmou que Décio lhe dissera que matara Delgado porque este queria pervertê-lo ao homossexualismo; o detetive Alfredo Zuquim contou sua saga em busca do assassino, não acreditando na culpa de Escobar; Nativo das Chagas confirmou que vira Delgado depois da meia-noite, ou seja, na madrugada do dia 6/12/1946; Ivo Hilário, em depoimento que muito ajuda o réu, confirmou que o poeta tinha o hábito de se recolher até as 23h00min horas, sendo, por isso, impossível ser o criminoso em virtude do horário em que o crime fora cometido, madrugada desse mesmo dia. Até um escritor - Jorge Carrasco - veio da Bolívia depor a favor do réu, elogiando seu interesse em divulgar para os bolivianos a cultura brasileira, o que lhe teria granjeado um longo círculo de amizade no meio intelectual em seu país.
Em seguida entra a acusação. Primeiramente fala o promotor Arnaldo Sena. Em fria acusação que não chega a entusiasmar a platéia, limitou-se a examinar detidamente os autos, prendendo-se aos depoimentos das testemunhas. Chamou a atenção do corpo de jurados para o homossexualismo do acusado, o fato de ele supostamente chegar a casa com a mão ferida e sobre suas diversas confissões do assassinato aos amigos. Depois entra Pedro Aleixo. Em uma hora de acusação, ele dá uma verdadeira lição de dialética e conhecimentos jurídicos, chegando mesmo a abrir mão do depoimento da esposa do réu, alegando ser muito importante para a acusação,necessária à manutenção do libelo acusatório contra Escobar. Foi aplaudido de pé pela multidão, apesar de estar, no íntimo, convicto de que Décio Escobar seria inocentado. Nem esperou o final do julgamento.
Aliás, o julgamento virara um circo: primeiramente, a mãe do réu, Dona Diva Frota Escobar, se transformara em sensação do julgamento. Chamada pela imprensa de "distinta", "heroína", "com fibra indomável" e outros tais, ela comandou a batalha pela absolvição do filho, dando entrevistas, visitando conhecidos e sempre tentando deixar claro para todos que nada existia de concreto contra Escobar a não ser o depoimento da esposa, que não podia ser levado em consideração pelo seu caráter emotivo. Exatamente o contrário do que dissera Pedro Aleixo. Depois, o comportamento da platéia, que participava ativamente do julgamento, rindo, vaiando, aplaudindo e se agitando no recinto. Às altas horas, a maioria dormia a sono solto, muitos roncando. Quando chegava a fome, o Fórum se transformava em um piquenique. O mais estranho era que o réu às vezes se levantava e saía tranqüilamente do tribunal, chegando mesmo a ir a um 
- Por que a esposa do acusado demorara tanto tempo para efetuar sua acusação, se eles já estavam separados há muito tempo?
- Por que a esposa, mesmo após a separação, escrevera cartas de amor ao réu, começando por "meu amor" e terminando com "da sempre tua, Yeda"?
- Por que as investigações relacionadas com o bailarino foram abandonadas pela polícia tão cedo?
- Por que Escobar teria que se encontrar com Delgado no interior do parque, se eram vizinhos no bairro Serra?

Segundo Pimenta da Veiga, Escobar não poderia ter sido o assassino, porque, primeiramente, estava dormindo, como de hábito, à hora em que o crime fora cometido; segundo, Delgado fora assassinado com objeto "perfuro-cortante", e a faca que supostamente pertencia a Décio era daquelas sem ponta. Além do mais, o advogado de defesa levantou uma questão primordial: como poderia Décio Escobar, ex-tuberculoso, de compleição franzina, não pesando nem sessenta quilos, e sozinho, ser o autor de 27 facadas em Delgado, um homem parrudão e chegado a exercícios físicos?
Os outros advogados de defesa seguiram essa mesma linha de raciocínio, a nota hilária do dia ficando por conta de um deles, Ney Messias, que causa profundo mal-estar no recinto ao chamar o acusado de "Cristo transviado e alucinado".
Escobar, chamado pela imprensa de  o “Dorian Gray das Alterosas”, foi considerado inocente por cinco jurados contra dois que o consideraram culpado. Foi a senha para cenas de histeria coletiva, a multidão aplaudindo freneticamente o resultado. Dona Diva, a "heroína", foi carregada em êxtase pela multidão, enquanto Décio, frente a um microfone, declamava o poema de Carlos Drummond de Andrade "E Agora, José?”.
 
Como o jovem poeta foi declarado inocente, o crime do Parque Municipal jamais foi esclarecido.

Escobar morreu alguns anos depois, assassinado a facadas num ponto frequentado por homossexuais.
Coincidência?
boteco próximo para beber um copo de leite, para escândalo dos repórteres cariocas e paulistas que cobriam o julgamento.
De repente um frisson no populacho: Pimenta da Veiga, no alto de sua imponência, começa sua defesa do réu. De maneira clara e objetiva, vai derrubando todas as acusações contra seu cliente, instalando a dúvida nos jurados. Em síntese, ele lhes perguntava:

Nenhum comentário:

Postar um comentário